Analógico e Digital – Integrar ou Desintegrar?

Os veículos de mídia encontram-se em diferentes estágios diante da internet e das demais plataformas digitais. Para uma minoria cada vez menor, ainda é algo distante, que um dia talvez acabe com o próprio negócio. Em alguns casos estas empresas são dirigidas por pessoas que, como eu, nasceram na época 100% analógica, onde nada disso existia e que foram bem sucedidas fazendo as coisas como era feitas, na época. Diferentemente de mim, porém, estas pessoas resistem, como quem segue em frente, com os olhos fechados, torcendo para que o mundo não acabe antes da gente. O futuro parece mesmo temeroso, seja pela bomba ambiental, atômica ou digital.

Na maior parte destas empresas, alguém da família dos acionistas, sempre mais jovem, recebe a tarefa de acompanhar o assunto, talvez fazer ou comprar um site e até contratar algumas pessoas, desde que mantenha este mundo o máximo separado do mundo real, aquele que paga as contas e os dividendos dos sócios. Isto seria suficiente para que estes dirigentes sintam que estão na internet, fazendo o que precisa ser feito.

 Há um segundo grupo, talvez a maioria absoluta,  que percebe bem, embora um pouquinho atrasado, que a era digital oferece um mundo de oportunidades e que os seus velhos atributos (como por exemplo, marca, conceito, relação com os clientes) podem ser sim, continuar a ser importantes diferenciais competitivos. Talvez não sejam mais suficientes por si só. Fatores como inovação, flexibilidade e gente podem ser ainda mais importantes. Não é verdade porém, que já não fossem determinantes antes. Nestas empresas que compõem o segundo grupo, o discurso costuma ser correto. Algumas o utilizam em campanhas de propaganda, e nos escritos internos, que funcionam quase que como declaração de intenções. Na prática, existem dois mundos separados, um analógico e outro digital, em que as pessoas se estranham e não precisam e nem fazem a menor questão de entender a lógica do outro lado. Isto é refletido diretamente na forma como o conteúdo é produzido (costumam existir editorias de internet que funcionam separadamente) e comercializados ( executivos tradicionais de um lado e outros de internet do outro, ainda que muitas vezes visitando os mesmos clientes, quando estes também não separam quem compra o digital).  Também no discurso fala-se em uma abordagem multiplataforma, mas ela não é real, a não ser que consideremos que o que é separado, em algum momento, no universo estará junto.

 Há uma rara minoria que já conseguiu superar este estágio e enfrenta de verdade os desafios da integração analógico x digital. Superar o estágio anterior não significa ter atingido a plena integração. Talvez ela nem exista e talvez nunca vá existir 100%. Significa, porém, lidar com coragem com as diferenças, com as incertezas, com as perguntas sem repostas certas ou erradas e com os infinitos obstáculos de processos existentes na produção do conteúdo e de sua comercialização. Pessoas lutam por espaços ocupados, desde que o mundo é mundo, e é fácil defender estruturas menos formais ou hierarquizadas quando não se está no topo. Ou defender integrações de editorias, quando um dos cargos que pode desaparecer não é o seu. Na defesa de posições, jovens de vanguarda costumam ser tão conservadores como o mais tradicional dos mortais.

O jogo é duro. Integrar passa por desintegrar o que já existe. A empresa de mídia que não estiver muito convicta da estratégia multiplataforma (se for este o caso), tenderá a recuar e optar pelo caminho mais fácil, e que, temporariamente, agrada a todo mundo: cada um de seu lado, vivendo com os seus próprios problemas, se possível, sem muito contato, que é para não incomodar.

(Fevereiro, 2011)