Como nos vingar dos maus tratos?

 O sentimento de vingança não é dos mais admiráveis. Na maior parte das vezes, faz pior a quem o sente do que ao alvo a que se dirige. Mágoas e vinganças são frequentemente associados a origens de doenças crônicas, e mesmo que não haja uma comprovação científica disso, parece que existe uma lógica, já que são sentimentos que ficam represados, representando o inverso de libertação, que é jogar o que não presta fora e seguir em frente. Adepto ao entendimento de que tudo que nos acontece tem um sentido e que todas as experiências, mesmo as aparentemente negativas, podem se transformar em positivas, dependendo do uso que fazemos delas, sou completamente avesso a estes tipos de sentimentos. Estou convicto mesmo de que mágoa e vingança não devem ser cultivados. Na teoria é isto que sinto. Na teoria, porque na prática, confesso que tem sido cada vez mais difícil eliminar o desejo de pequenas vinganças dos maus tratos de empresas prestadoras de serviços. As mesmas que nos fazem esperar uma eternidade ao telefone, ouvindo uma gravação dizer que para elas nós somos muito importantes, para em seguida, ir transferindo de atendente a atendente, até que a ligação caia, nos obrigando a recomeçar tudo de novo. Ou as que simplesmente não cumprem o combinado, como a empresa de transportes que faz a entrega quase sete dias depois do tratado, e sem ao menos, um pedido de desculpas. Vale também para os planos de saúde, a quem você paga por anos, às vezes sem fazer uso, e quando precisa por uma doença mais grave, parece que está pedindo favores, dependendo de uma autorização especial de uma entidade qualquer. Das empresas aéreas, telefônicas, bancos e empresas de TV a cabo, todos temos histórias vividas, algumas bem absurdas. Reunidas elas constituem verdadeiros cases de como maltratar consumidores fiéis, por tanto tempo. As mesmas empresas, os mesmos clientes. Sim, porque a velha vingança do cliente que seria a de não consumir mais o serviço ou o produto não vale para o nosso mercado. Faltam opções, falta concorrência. E as alternativas estão ficando menores. A cada movimento de fusão ou aquisição, as opções diminuem ainda mais. Segmentos de supermercados, companhias de aviação, varejo eletrônico, indústrias de alimentos e diversos outros, cada vez estão mais concentrados. Fala-se nos ganhos de escala. Para os consumidores, o efeito mais visível é a diminuição do poder de fazer escolhas, que já foi apontado como o grande paradigma dos tempos atuais. Em alguns casos, cabe o recurso jurídico, que é moroso, trabalhoso e exige de nós algo cada vez mais raro, que é tempo. Algumas poucas vitórias neste campo, no entanto, uma contra uma empresa telefônica e outra contra um plano de saúde, me sinalizam que nem tudo está perdido. As recompensas podem não ser proporcionais mas, o princípio de que se fez justiça, é algo muito gratificante. De resto, cabem outras pequenas vinganças, como contar o caso a um número x de pessoas, registrar nas redes sociais (isto não fiz ainda) e outras mais inovadores. Tenho feito exercícios de criatividade, elaborado planos e discutido com os amigos mais próximos, novas maneiras de pequenas vinganças. Não entro em detalhes, pois isto alertaria os adversários. A vingança não é mesmo um sentimento nobre. Não faz bem para o espírito e para o corpo. Às vezes, no entanto…

(Setembro, 2011)